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A um passo do hospício

A um passo do hospício

Sex | 23.05.25

A Trilha Sonora do Caos Público

Vampyresca

Há dias em que o transporte público se transforma num concerto improvisado — pena que sem talento, sem convite e, sobretudo, sem fones de ouvido.

Lá estou eu, tentando manter a sanidade num autocarro cheio, entre uma senhora que reza o terço em sussurros e um adolescente que decidiu que todos devíamos ouvir a sua playlist. Funk, trap, kizomba, sertanejo... tudo em modo aleatório e em volume máximo. Como se o mundo fosse o seu palco, e nós, meros figurantes da sua epopeia sonora.

Mas não é só a música. Há também os comentaristas da vida, aqueles que ligam para alguém (sempre com sinal impecável, vai-se lá saber como) e começam a relatar em voz de estádio tudo o que fizeram no fim de semana, o que a vizinha disse, o que o primo fez, e o que a sogra comeu. Numa fração de minutos, já sei mais sobre aquela família do que sobre alguns dos meus amigos.

E eu pergunto: o que leva alguém a achar que estamos todos ansiosos por participar, involuntariamente, na sua banda sonora pessoal ou nos seus dramas familiares?

Será carência de atenção? Vontade de afirmar presença num mundo que parece cada vez mais apático? Ou apenas uma profunda falta de noção?

É certo que o espaço é público — mas o respeito devia ser obrigatório. Porque viver em sociedade é, acima de tudo, esse exercício diário de não enlouquecer os outros (e de evitar que nos enlouqueçam também). Cada um com os seus fones, o seu silêncio, a sua introspecção... e, quem sabe, um pouco mais de empatia.

Enquanto isso, lá sigo eu — a um passo do hospício, com banda sonora alheia e uma paciência que já viu dias melhores.

 

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